A disputa entre o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) pela exploração da Rota Solimões, que tem se consolidado como principal corredor do tráfico de drogas no país, acabou refletindo em Mato Grosso e tem tornado municípios do Estado um verdadeiro "campo minado". 6ig3q
Dezenas de homicídios, violência e constantes apreensões de drogas e armas pelos órgãos de Segurança Pública são cada vez mais comuns em cidades disputadas por essas organizações, principalmente aquelas localizadas em região de fronteira com a Bolívia.
Apesar do Estado ser majoritariamente "comandado" pelo CV, a rota do narcotráfico no Estado chamou a atenção da facção rival que, ainda que em menor número, tem tentado expandir seus braços em Mato Grosso.
Em entrevista recente, o promotor Adriano Roberto Alves, chefe do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de Mato Grosso, explica que o PCC tem um grande interesse na região de fronteira com a Bolívia porque o país vizinho é um grande produtor de cocaína de qualidade no mundo - o que o torna uma "mina de ouro" para essas facções.
No entanto, o interesse não para por aí. O objetivo é levar essa droga da Bolívia até o Norte do país, onde é possível enviá-la para os Estados Unidos e Europa.
Para esse destino final, as organizações criminosas vêm formando uma espécie de "corredor do narcotráfico" em Mato Grosso, o que, segundo o chefe do Gaeco, reflete em constantes confrontos entre o CV e PCC.
O promotor explica que, anteriormente, as facções enviavam as drogas para a Europa e Estados Unidos por meio do Porto de Santos, no Sudeste do país. No entanto, uma possível falta de fiscalização e brechas no policiamento nos portos da região Norte teriam atraído a atenção das organizações e feito com que o CV e o PCC assem a buscar novas rotas de "exportação" que sejam ligadas a essa outra área.
“Cáceres, Barra do Bugres, Sorriso, Sinop, Peixoto de Azevedo, Tangará da Serra, e Pontes Lacerda são as áreas mais críticas onde estão acontecendo esses embates [entre as facções]. Eles estão usando esses caminhos porque eles têm os portos do Norte do País, coisa que antes não tinham. São alguns portos menos vigiados, com menos policiamento, menos investimentos e menor fiscalizações por parte do Estado, o que pode justificar essa tendência”, esclarece.
Corredor em MT e Rota Solimões
O corredor do narcotráfico formado pelas duas facções rivais em Mato Grosso começa no sudoeste do Estado, em municípios que fazem fronteira com a Bolívia, e sobe para o norte mato-grossense, até chegar no Pará e se conectar, por fim, à Rota Solimões, a principal do narcotráfico no país. A Solimões, na verdade, é formada por 50 rotas menores, com vias de o aéreo, terrestre, fluvial e marítimo.
Os municípios mato-grossenses citados pelo promotor são, então, o principal alvo de controle das organizações, para que elas atinjam a Solimões.
Essa nova rota foi debate agora no Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a 'Rota Solimões'. Aqui [Mato Grosso] integraria com a Rota Solimões e mandaria - até porque é mais perto - a droga para Europa e Estados Unidos. Essa disputa por controle tem culminado no aumento da violência na região", afirma.
Dados da Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso atestam a escalada da violência nesses municípios. Conforme estatísticas da Sesp, houve um aumento de 69% no número de homicídios em Cáceres, por onde sai a droga, de 2021 para 2022. O número de homicídios dolosos subiu de 42 para 71.
Em Sinop, onde foram registradas 126 mortes em 2022, o aumento foi de 47%.
Em Pontes e Lacerda, o índice de homicídios cresceu 50%, ando de 28 para 42.
Os números também são alarmantes no índice de apreensão de armas de fogo na região de fronteira, principalmente em Cáceres, com um aumento de 1.071%, ando de 73 para 855 apreensões. Em Sinop, o aumento foi de 19%, ando de 241 para 287.
O aumento na taxa de apreensão de drogas em 2022 também foi considerável em alguns desses municípios: Pontes e Lacerda teve aumento de 180%, com 6,6 toneladas apreendidas; Sinop teve aumento de 46%, com a apreensão de 2,6 toneladas; e Cáceres 14%, com 3,7 toneladas.
Outro exemplo são conversas interceptadas durante a Operação Kraken, deflagrada pela Polícia Civil de Cáceres, que teve como alvo lideranças do PCC que atuam em Cáceres e Mirassol D'Oeste. Um dos diálogos mostra que a facção paulista não abre mão do controle de carregamento e distribuição de drogas e determinam execuções de membros do CV. Em um diálogo entre um detento do PCC e um criminoso solto, o faccionado afirma que Sorriso e Sinop supostamente estariam dominados pela facção paulista.
“Pega a visão aí molecadinha, Sinop, Sorriso, MT, tudo é T PCC fii, quem fechar com o Comando Vermelho está fudido, a gente vai pegar em casa fii (Sii), pega a visão aí, que é o três, é o três, bala no trem bala” (sic), disse.
Esse cenário levou Sorriso a se tornar a sexta cidade mais violenta do país, conforme o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Rota Solimões
A Rota Solimões ganhou este nome pois as organizações começaram a usar o Rio Solimões, no Amazonas, para escoar drogas da Colômbia, Peru e Bolívia em grande quantidade, principalmente cocaína e skunk, para depois distribuir para o restante do país e exterior. A droga é transportada em barcos e pequenos aviões. Por vias terrestres, as rotas mais utilizadas am por Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Tocantins. Na rodovia Cuiabá-Porto Velho se dá a ligação das redes que partem da Bolívia na região de fronteira com Rondônia e a integração de Mato Grosso com o oeste do Pará por meio da BR-163.
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